Com cara de importado, “Memórias de um Gigolô” é o que faltava em musicais nacionais
Protesto no palco, músicas brasileiras e cara de espetáculo importado. Esse foi o resumo da pré-estreia do musical “Memórias de um Gigolô” para convidados na noite de segunda-feira.
Antes da peça começar, Miguel Falabella subiu ao palco com dois atores mirins com fita adesiva na boca demonstrando censura. Matheus Braga, 13 anos, e Kaleb Figueiredo, de 10, foram proibidos de atuar no musical pelo juiz da Infância e Juventude do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, Flávio Breta Soares, que achou o texto inapropriado.
A grande contradição é que os dois foram proibidos de atuar já que palavras como ‘masturbação’ poderiam prejudicar o desenvolvimento psíquico dos menores, mas crianças a partir de 10 anos podem assistir à peça sem problema algum.
“O teatro, senhor Juiz, muito pelo contrário, ensina esses dois jovens talentos a dominar a língua, a se expressar com clareza, a aguçar o raciocínio e a olhar o mundo com os olhos da poesia. E o teatro musical ainda por cima lhes ensina música”, disse Falabella em seu discurso antes do início do espetáculo.
“Fiquei muito triste com essa censura desnecessária porque era uma oportunidade incrível para as crianças. Eu no lugar deles ia estar muito frustrada por não poder participar”, afirma Maria Bia que esteve em “Sexo e as Negas”, da TV Globo, idealizada por Miguel Falabella, ao ser questionada sobre a ação judicial que segundo ela, deveria ser revista.
“Não tem nada a ver o que eles falaram, eu não vi nada de mal que fosse prejudicar o psicológico das crianças, até porque elas estão acompanhadas pelos pais. Eu achei desnecessário e não estou disposta a esse tipo de censura.” prossegue a atriz, que mesmo com o incidente diz ter gostado bastante do espetáculo.
História
“Memórias de um Gigolô” é baseado no romance do escritor paulista Marcos Rey, publicado em 1968 e adaptado por Miguel Falabella que também dirigiu a peça e escreveu 14 músicas originais junto de Josimar Carneiro.
A história retrata as memórias de um gigolô da boêmia paulistana. Mariano (Leonardo Miggiorin) é órfão e foi criado por uma cafetina dentro de um bordel, onde aprende os trambiques e como ser gigolô. É lá que ele conhece a prostituta Guadalupe (Mariana Rios) e se apaixona. Ela se vê então, dividida entre Mariano e seu cafetão Esmeraldo (Marcelo Serrado).
Leonardo Miggiorin explica a sua visão do musical. “O espetáculo conta a história do Mariano, que é meu personagem. Ele começa como criança, aos 12 anos e vai crescendo. Ele perde a família, perde a mãe, a tia, ele perde tudo e vai morar num bordel, onde ele aprende a ganhar da vida, onde ele aprende a se safar.”
O ator também fala sobre a paixão de Mariano por Guadalupe e o envolvimento com Esmeraldo.”É a história de um triângulo amoroso, pungente, intenso mas com muita leveza. É um espetáculo musical, onde as pessoas se divertem, curtem, tem muita dança, muita poesia”, conta Miggiorin.
Além disso, retrata uma São Paulo no ápice de seu crescimento industrial e de mudanças culturais e políticas que aconteceram entre os anos 1930 e 1950, como o crescimento urbano, a política do café com leite, a Revolução de 1932 e manifestações artísticas.
Marcelo Serrado, que interpreta Esmeraldo fala sobre a época do musical. “O espetáculo é uma grande homenagem a São Paulo. Tudo acontece quando o cenário dos anos 30 e da época vai mudando”, explica o ator.
“Gigolô” foi o primeiro musical de Serrado e só teceu elogios à colega de elenco, Mariana Rios e ao diretor Falabella. “A Mariana tem uma voz impressionante e eu estava muito ansioso pra trabalhar com o Miguel, ele é bem criterioso e foi muito bom ter estreado ao lado de pessoas tão boas”, completa Marcelo que também tem outra estreia essa semana, mas na televisão: o programa de comédia Tomara que Caia.
Paula Lima que esteve presente na pré-estreia contou que já havia lido o livro de Marcos Rey. “Eu já tinha lido, mas quando assisti ao musical consegui entender a história de São Paulo”, afirmou.
“Memórias de um Gigolô está em cartaz no Teatro Procópio Ferreira, de quinta a domingo, a partir das 21h. Vocês estão todos convidados para se encantar com a São Paulo de 1930 e com o triângulo amoroso de Mariano, Guadalupe e Esmeraldo. Venham curtir o espetáculo, vale a pena” explicou Leo Delgado, produtor e assessor da Chaim Produções que produziu o musical e está com outro projeto em andamento, o de comemoração aos 30 anos de carreira da Claudia Raia.
Com cara de importado
O romance já tinha dado origem a uma minissérie exibida pela TV Globo em 1986, mas hoje tomou padrões tão altos que pode ser equiparado a musicais internacionais a la Broadway. Entre arranjos musicais, transição de cenário, figurinos, tudo foi produzido dentro do país. Miguel Falabella conta que mesmo com um mercado crescente para musicais, incluindo brasileiros, ainda é muito difícil conseguir um patrocínio para produções nacionais.
“Espetáculos como esse, preenchem uma lacuna que é o que mais a gente precisa: ter musicais brasileiros, compostos com músicas brasileiras. Missão cumprida, eles estão de parabéns”, afirma Nando Prado, que participou de “O Fantasma da Ópera” e acredita que Gigolô é um grande exemplo a ser seguido.
“A gente importa muita coisa e está na hora de fazer os nossos. Precisamos de mais musicais com a nossa cara e com a nossa musicalidade “, finaliza o ator.
O musical conseguiu angariar R$ 3 milhões via Lei Rouanet, enquanto um outro espetáculo que Falabella irá participar, “Antes Tarde do que Nunca” com estreia em 20 de agosto, por ser versão da Broadway captou R$ 5,6 milhões também pela Lei Rouanet.
O ator Leopoldo Pacheco que foi prestigiar os colegas e assistiu ao musical na segunda falou um pouco sobre o mercado de musicais no Brasil. “O país já tem espaço para os musicais. Já é possível ver esse nicho de mercado crescendo. Eu só tenho a desejar toda sorte para o Falabella e o elenco do espetáculo”, declarou o ator.
MEMÓRIAS DE UM GIGOLÔ
Horários: Quintas às 21h, sextas às 21h30, sábado às 18h e às 21h30 e domingo às 18h; até 30 de agosto.
Local: Teatro Procópio Ferreira, R. Augusta, 2.823, tel. (11) 3083-4475
Ingressos: R$ 50 a R$ 180
Classificação: 10 anos